quarta-feira, novembro 29, 2006

Um ano

Um ano depois da entrada de novos proprietários, ninguém melhor do que o grande Fialho de Almeida para descrever a pândega que para ali vai:

«Não está um caso bonito? O pobre diabo sarabandeando os neurónios, listrando d’amarelo e vermelho as calças dos períodos, aparando os calos dos tropos, pondo barretininhas de chifre na cabeça marcial dos adjectivos, enfileirando páginas, coitado, um ano preso à banca do suplício, a recoser-se, a derreter para ali os torresmos da psicologia e da sintaxe - sujeito aos juízos deprimentes da turba, à popularidade insultante da rua, às insolências invejosas da crítica - e tudo isto para afinal do licoroso melão comer apenas as cascas, e toda a pitança da polpa cantar no buxo do agiota irónico que o edita!»

De fora, não fosse a tragédia de ver o gigante colapsar com uma crise de soluços, à mercê de uma qualquer fisga de ocasião e infligindo golpes absurdos na sua própria couraça, eu riria a bandeiras despregadas. Melhor seria se o gigante se visse livre das fístulas que lhe infectam a pele e lhe toldam a mente.

quinta-feira, novembro 23, 2006

Tudo de Repente


Espera-se, desespera-se, volta-se a esperar.
Aguardam-se meses pela ansiada publicação.
Depois, num ápice, acontece tudo de uma vez.
Em finais de Setembro, a Porto Editora publicou em livro a versão adaptada da minha investigação sobre a consolidação da Quercus como fonte das notícias de ambiente. Tenho agora a comunicar que está nas livrarias o número 2 da "Comunicação & Cultura", revista semestral, com peer-review, publicada pela Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa e pela Quimera Editores.
A obra, dedicada este semestre a Lobbying e Marketing Político, inclui um artigo da minha autoria, intitulado: "O Caso ICN, Convergência Entre Jornalistas e Fontes".
Olhando para o contributo dos autores que publicam também nesta edição, não posso deixar de pensar que não poderia estar em melhor companhia.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Os pânicos que nos relatam

Num artigo muito interessante, Kepplinger e Habermeier (1995) apreciam as ondas mediáticas (“news waves”), a torrente de notícias publicadas sobre um tema e geralmente despoletadas por um evento extraordinário, disruptivo, que altera a percepção que os jornalistas e os seus editores tinham sobre determinado assunto.
Dizem os autores que “os leitores de jornais assumem quatro coisas como factos garantidas: 1 – Que os eventos noticiados realmente ocorreram; 2 – Que ocorreram da forma como foram noticiados; 3 – Que os eventos importantes recebem coberturas mais extensas; 4 – Que, se alguns eventos ocorrerem com mais frequência, mais notícias serão publicadas” (1995: 371-372).
Os dois sociólogos recomendam prudência aos investigadores: há uma tentação muito grande para considerar que a cobertura noticiosa alargada reflecte um agravamento do respectivo problema social. Ou seja, mais notícias significariam mais ocorrências, e o problema agudizado.
A pesquisa empírica, baseada em fontes complementares, desmonta frequentemente este paradigma. Muitas vezes, não há aumentos palpáveis nos dados estatísticos referentes a assaltos, a crimes violentos, a acidentes nucleares, a terramotos ou a qualquer problema que esteve na base da onda mediática. Simplesmente, os repórteres sintonizaram um tema a que antes pouco ligavam. Por outro lado, os leitores, ouvintes ou espectadores respondem com mais atenção a notícias tematicamente associadas ao evento-chave que esteve na base da onda mediática. Assim, e como outros assaltos, outros crimes, outros terramotos, outros incidentes nucleares continuam a ocorrer algures no país ou no mundo, os media respondem à crise sobrevalorizando notícias que anteriormente teriam passado pelo crivo.
Kepplinger e Habermeier concluem que os critérios de selecção jornalística são menos fixos do que julgávamos. São mais voláteis. Por força de um evento extraordinário, podem ser orientados para outro tipo de notícias, modificando o processo de triagem e redacção. Mesmo que o problema social se mantenha genericamente igual.
Esta semana, noticiou-se abundantemente a dificuldade de reinserção de ex-presidiários. Não há – aposto eu, embora não existam obviamente dados estatísticos referentes a este ano – necessariamente um agravamento dos crimes cometidos por ex-arguidos. Mas a publicação de um relatório europeu e outro português despertou o alarme nas redacções. E um problema social (que, repito, deverá permanecer estável) tornou-se um problema mediático, gerando um pequeno pânico colectivo.
Voltarei ao tema.

Bibliografia
Kepplinger, Hans Mathias e Habermeier, Johanna. The Impact of Key Events on the Presentation of Reality. European Journal of Communication, 1995, vol. 10 (3), pg. 371-390

terça-feira, novembro 21, 2006

A Propósito de Injustiças Recentes…



(clicar na imagem para ampliar)

Já Oliveira Martins distinguia Influência e Prestígio: mais vale uma boa cunha do que toneladas de prestígio – José Rodrigues Miguéis, em "É Proibido Apontar".
Não é, Zé?

segunda-feira, novembro 20, 2006

Embaixadas de Portugal



Chama-se Miguel Valle de Figueiredo e é um dos melhores fotógrafos que conheci. Tem um talento proporcional ao mau génio, mas a quem sabe tudo se desculpa.
Em projectos de comunicação, destinados ao público e não a elites, há enorme pressão exercida por editores e designers sobre o fotógrafo e a fotografia. De editores de fotografia, já se sabe, todos temos um pouco.
O Miguel é um dos profissionais que melhor se defende – talvez seja essa a sua melhor qualidade. Só faz as concessões que entende aceitáveis, pois é daqueles que prefere quebrar a torcer. O seu trabalho foi, durante muito anos, exposto na revista "Volta ao Mundo", consolidando uma qualidade fotográfica que, mesmo desvirtuada, travestida e poluída, o público ainda associa à revista.
Foi lançado agora nas livrarias o seu último projecto. Chama-se "Embaixadas de Portugal" e regista, em película, os edifícios que nos representam no estrangeiro. Edifícios velhos e edifícios novos. Em ruínas ou bem conservados. Nas capitais industrializadas ou em cidades em vias de desenvolvimento. Em ícones da lusofonia ou em destinos exóticos que poucos laços mantiveram com a nossa história.
António Sérgio escreveu que a promoção de um país no Mundo faz-se pela valorização das pedras vivas (as pessoas) e não das pedras mortas (os edifícios).
Permita-me o escritor que o corrija: pelos olhos do Miguel, as pedras mortas ganham vida.

quinta-feira, novembro 16, 2006

Estou Fazendo Amor com um Neanderthal…


Do "Público" de hoje, página 28, "Genoma dos Neandertais Mostra que Não São Nossos Avós":

«Uns consideram que os neandertais têm de ter transmitido os seus genes aos humanos modernos. Portanto, fazem parte dos nossos antepassados. Como são os hominídeos extintos mais parecidos connosco, é o mesmo que dizer que são nossos avós, e para isso, neandertais e humanos modernos tiveram de fazer amor.

(…)
Para outros, os humanos modernos chegaram à Europa vindos de África, há cerca de 40 mil anos, e simplesmente dizimaram os neandertais. Para este cientistas, fizeram guerra e não amor. »

terça-feira, novembro 07, 2006

Demasiado Ocupado

Cinco semanas depois, é legítimo concluir que a minha apreciação do trabalho jornalístico do "Público" durante o mês de Setembro não foi suficientemente viva para merecer uma observação do provedor dos leitores.
Enviada para o endereço electrónico indicado pelo jornal, a queixa foi seguramente preterida por reivindicações bem mais pertinentes, como a deliciosa apreciação das gralhas e erros de ortografia, especialidade inquestionável deste provedor, ou a meritória dissertação sobre América Latina versus América Latrina.
Ficarei à espera de melhores dias para ousar submeter nova queixa. A triagem, por aquelas bandas, é apertada.

segunda-feira, novembro 06, 2006

Auto-Promoção Descarada

Em maré de apresentações, faço notar que estarei na Universidade Fernando Pessoa, no Porto, no dia 9, às 18h30, em muito boa companhia.
Por iniciativa da Porto Editora, e sob a autorizada chancela dos professores Joaquim Fidalgo e Manuel Pinto, serão apresentadas as seguintes obras:
"Mercados Televisivos Europeus – Causas e Efeitos das Novas Formas de Organização Empresarial", do meu amigo Luís Oliveira Martins.
"A Quercus nas Notícias – Consolidação de uma Fonte Não Oficial nas Notícias de Ambiente", de yours truly
"Comunicação, Economia e Poder" (organização de Helena Sousa)
"Introdução aos Cultural Studies", de Armand Mattelart e Érik Neveu
"Sociologia dos Públicos", de Jean-Pierre Esquenazi

Apareçam.